sábado, 7 de junho de 2008

A BOCA DO BRASIL

Quando eu comecei a pensar no que eu ia sentir falta de Salvador, me ocorreram várias visões: um ônibus vazio, voando pelas ruas coloridas, um vento quentinho entrando pela janela aberta, com o cheiro de cocada, pequenos fragmentos de todo tipo de música vêm de todo canto da rua, formando uma melodia nostalgica que combina com a paisagem.
Eu tenho certeza de que todo aluno no nosso programa tem uma visão parecida que, quando eles voltarem para suas terras, vai resumir vários sentimentos dessa experiência brasileira. Sem dúvida, essa visão vai incorporar os cinco sentidos, vislumbres da realidade dura e também pedacinhos das memórias romantizadas e idealísticas. Essa saudade brasileira vai vir à tona em momentos imprevisíveis no futuro, quando nós já estabelecermos as nossas vidas rotineiras de novo.
Mas hoje eu optei por escrever sobre algo relacionado especialmente a mim, algo que eu, pessoalmente, vou sentir falta: as idiossincrasias da língua portuguesa brasileira. Eu adoro essas particularidades que não têm comparação em nenhuma outra língua. Por exemplo, agora eu estou tão acostumada a responder a uma pergunta com a conjugação do verbo adequada (em vez de “sim” ou “não”) que eu costumo usar a mesma estrutura quando estou falando inglês ou espanhol!* (“tú hablas castellano?” “Hablo.”) Eu também tenho muita vontade, ou necessidade, de usar o verbo “ficar” em inglês ou espanhol, mas não existe um verbo equivalente! O verbo “ficar” tem muita flexibilidade e pode ser usado informalmente em muitas circunstâncias. Em inglês, temos o verbo “to get” mas quase não existem regras para o indício do uso desse verbo; o uso é bem imprevisível.
Outro exemplo seria a flexibilidade do uso da palavra “não” no Brasil, sobretudo no Nordeste. A negação de um conceito não tem de vir no início de uma frase (pode dizer “não sei,” “sei não,” “não sei não”).
Mas a gota d’água foi o seguinte: a semana passada eu estava conversando com a minha mãe pelo telefone quando ela perguntou em inglês se a gente gostaria de fazer tal coisa. Aí, eu respondi, “Yeah, the people would.”

*Já li que os irlandeses nas áreas mais rurais costumam responder às perguntas com a conjugação do verbo adequada, tal costume é um resto do gaélico irlandês.

3 comentários:

val disse...

rhea, de verdade gostei muito de ler seus textos relacionados ao linguistica e sua experiencia no brasil. eu tambem vou morrer de saudades de conversar em nosso querido portugues...por sorte, temos skype para matar essas saudades!!!!!!!!

Kyle disse...

Rhea,
Essas idiossincrasias são tão interessantes, e você tem feito um trabalho genial de indicar varias delas nesse blog. E eu acho que toda pessoa no programa está começando a falar as outras linguas até inglês numa maneira diferente agora. Acho isso interessante também, que a lingua que cada pessoa fala não é determinada simplesmente pela padrão da lingua, mas também pelas experiências individuais de aquela pessoa. De qualquer jeito, tudo isso é muito interessante para mim e eu gozei de pensar nos assuntos que você introduziu.

Caitlin disse...

Minha querida nerd da sociolinguística! Te adoro. Sempre achava que o verbo "pegar" foi mais parecido com "to get" em inglês... o que é que você acha disso?